Monday 16 September 2013

Quatro

Há exactamente dois meses atrás escrevi algumas notas e estatísticas sobre a minha viagem. Agora que já são quatro, acho que está na altura de uma actualização (com as repetições necessárias, obviamente).

Cidades favoritas:

Reykjavik - pela vibe cultural e relaxada;
Copenhaga - pela beleza dos edifícios e o contraste entre o moderno e o clássico;
Sarajevo - pela dualidade de religiões e estar preservada do turismo massivo, pelas marcas da guerra;
Berlim - pela história, pela vibe alternativa;
Graz - pela beleza das coisas simples e pela pacificidade;
Istambul- pelo primeiro contacto com o caos, pelas mesquitas, pela diversidade;
Leh – pela distância de tudo e a calma que transmite.

Países favoritos:

Islândia - pela natureza e território único;
Croácia - pelas praias, as ilhas, o azul turquesa das águas;
Dinamarca - pelas ciclovias e o sentimento de equilíbrio;
Turquia – pelas pessoas, a comida, a beleza e diversidade do território.
Colocaria também a Índia nesta lista, mas a minha estadia aqui ainda não terminou.

País onde irei passar mais tempo: Índia (dois meses e meio).
País onde passei menos tempo: Sérvia (menos de 4 horas).
Máximo de horas num autocarro até agora: 23 horas de Manali a Leh (Índia).
Máximo de quilómetros feitos à boleia (e a pé) numa única trajectória: apróx. 720 km (Nis na Sérvia até Istambul na Turquia, atravessando a Bulgária).
Número de fronteiras atravessadas a pé: 2 (Sérvia - Bulgária e Bulgária - Turquia).

O quinto mês será ainda aqui na Índia. O que sinto mais falta é da comida "Europeia", ou "continental", como eles chamam aqui por motivos que desconheço porque continentes há vários. Sinto falta da carne sem especiarias a monte e especialmente do peixe fresco, bem grelhado, com umas batatas cozidas e salada temperada como manda a cozinha Portuguesa.
O meu reino por um litro de azeite virgem extra lá da terra da minha mãe, haha.

Sunday 15 September 2013

Questões e Indecisões

Algumas das pessoas com quem me tenho cruzado perguntam-me o propósito. O que espero ganhar com esta experiência. O porquê.
A minha resposta? Inconclusiva.

Vivemos numa era de porquês. Tudo tem que ter origens, argumentos a favor e contra, teorias, razões. Eu pergunto-me o porquê de querer explicações quase científicas para um sentimento, uma vontade.

Questionar tudo, questionar a nossa vida, a sociedade em que nos inserimos (ou não), a nossa cultura, questionarmo-nos a nós próprios, questionar aqueles que valem a pena, e mesmo os que não valem, se valer a pena, é uma das máximas que tenho na minha vida. Ao fim destes quatro meses, as questões existem dentro de mim.
Não sejamos cínicos, a indecisão é uma constante de quem viaja. Afinal de contas muita gente diria que sou maluco por fazer o que estou a fazer, e se há constante nos malucos é a multiplicidade de ideias.

Mas ao mesmo tempo não encontro a resposta certa para essa questão tão pertinente. “É um sonho de miúdo”; “É um objectivo que sempre quis cumprir antes de chegar aos 30”; “É parte da minha busca incessante por mais informação, mais conhecimento, mais cultura, mais vida”. Será?

Se há coisa que sei é que não me meti nisto para me descobrir a mim próprio. Que cliché de merda, sinceramente. Irrita-me sempre que leio esse tipo de sentimentalismos em textos sobre viagens…sim o ser humano está sempre a “descobrir-se” e tal, e quer dizer, se estivesse a fazer isto com dezoito ou dezanove anos tudo bem, mas aos vinte e seis estar a viajar não vai fazer um reset na minha existência. 
Não vou deixar de ser um gajo urbano só porque passei noites em montanhas, não vou deixar de gostar de música pesada e chateada só porque passei horas a ouvir baladas de vozes suaves e violas que embalam a alma, não vou deixar de negar a todas as religiões só porque visitei alguns dos mais bonitos locais de oração que a mão humana já construiu em nome de deus, ou de amar o sabor de um bife grelhado, só com sal alho e pimenta, só porque passei semanas a comer refeições vegetarianas.

Mas sim, vou mudar. Sinto-me a mudar. Sinto que agora existem ainda mais coisas com as quais já não me consigo relacionar. Muitas coisas que já não fazem sentido, muitas coisas que me assustam. Sinto coisas que não consigo compreender, ou não quero.

Assusta-me a indecisão de voltar a Londres ou não. Se a vou sentir tão minha como senti mesmo antes de me ir embora, se vou conseguir aceitá-la como ela é, mesmo sabendo o quão erradas são muitas das coisas que fazem parte dela, quando comparadas com o resto do Mundo que agora conheço e faz parte de mim. 
Assusta-me se ainda vou conseguir relacionar-me com os meus amigos, os mais antigos e os mais recentes. Sinto cada vez mais a distância física e mental, sinto cada vez mais que estamos em universos paralelos, e que a perpendicularidade não depende unicamente dos sentimentos que tenho para com eles e que sei serem recíprocos mas mal nutridos. 

Verdade seja dita, é a verdade que me assusta. É a luta de mim contra mim próprio que me consome, é o saber que um dia vou acordar sem os sabores, as caras, as aventuras, e as dificuldades serão outras, mais ou menos existenciais. E que o único responsável, para o bem e para o mal, sou eu.

E o tempo continua a destruir tudo.

Post influenciado e escrito ao som de:


Let it all work out.

Monday 2 September 2013

Contemplações

Ao princípio confesso que me fazia confusão.
Não é que eu faça por menos, com as minhas roupas ocidentais e aspecto de viajante é difícil passar despercebido (com a mochila às costas então certamente está o circo armado em qualquer parte do Mundo), mas ao mesmo tempo não conseguia perceber tanto "olhar especado”, como diria a minha mãe.
Por isso baixava a cabeça, tomava medidas evasivas, fazia de tudo por esquivar os olhos e os rostos, que chegavam a ser às dezenas caso a situação fosse de multidão, coisa que é comum a qualquer hora do dia, em qualquer rua mais comercial da Índia. Um bilião tem destas coisas.

Feito quase um mês, com o discurso do “não obrigado” já gasto e a mente habituada o quão possível à realidade que te dá chapadas de mão cheia cada vez que sais à rua, decidi contra-atacar.
E, surpreendentemente, depois do olhar, está um “olá tudo bem”, e no geral uma curiosidade intrínseca, ingénua até, mas acima de tudo humilde. Alguns, claro, são motivados pelo negócio, afinal a sobrevivência aqui nem sempre é a do mais forte mas sim a do mais esperto, mas a maioria quer apenas saber de onde venho, o que já vi do seu país/região, e, uns poucos, para minha maior admiração, perguntam ainda se há algo que possam fazer por mim, ou se houve algum problema até à data.

E de repente, com três simples passos – o ripostar o olhar, sorrir e dizer olá – a contemplação passa a apertos de mão (alguns bem longos, porque aqui há o hábito de segurar mãos entre homens), a pequenas conversas, a trocas de nomes, a pequenos pedaços de humanidade que quase sempre mudam o meu humor para melhor.
São metediços é certo, e extraordinariamente frustrados em alguns níveis (particularmente o sexual), mas afinal de contas eu é que sou o peixe fora de água. Mais uma vez é só colocar em perspectiva.
Aqui a mecânica é simples: vai dando chances. Se na primeira algo corre mal, ou te decepcionas, certamente na segunda ficas duplamente impressionado, e tudo se compõe.


Já dizia o outro: é um delicado sentido de equilíbrio, este que se sente por aqui.